O
apóstolo Paulo, escrevendo aos Romanos, no capítulo 13:8, diz: “a ninguém
fiqueis devendo coisa alguma, exceto o amor com que vos ameis uns aos outros,
pois quem ama o próximo tem cumprido a lei”. No versículo 10 diz, ainda, que “o
amor não pratica o mal contra o próximo; de sorte que o cumprimento da lei é o
amor”.
Para
muitos, o amor é um sentimento que se encontra apenas no plano simbólico,
desconectado de ações que lhe deem materialidade. Mas todos nós somos
testemunhas de que, para padre Pedro, o amor não consistia num sentimento
abstrato e desprovido de sentido. Pelo contrário, esse mandamento divino, desde
muito cedo, ganhou vida em suas escolhas, iniciando pela decisão de renunciar a
uma vida pessoal, profissional e familiar em favor da vida sacerdotal.
No
exercício do sacerdócio, o amor continuou se evidenciando na sua firme opção de
permanecer ao lado dos mais pobres, nas incontáveis oportunidades em que deu
voz aos silenciados do seu mundo; Padre Pedro revelou o amor quando acreditou,
defendeu e criou oportunidades para que as mulheres de nossa terra acreditassem
em seu potencial e conquistassem um espaço no mercado de trabalho; o amor se
materializou em sua vida quando construiu moradias para tantos que delas
precisavam, quando providenciou os meios necessários para que os universitários
desta cidade concluíssem seus cursos em outros municípios, num momento em que o
próprio poder público não se comprometia com essa causa; quando criou um
cursinho para aprimorar a formação dos estudantes, quando defendeu uma justa
reforma agrária, quando denunciou as injustiças sociais, quando se indignou com
a miséria.
O
amor, na vida de padre Pedro, revelou-se, também, no zelo pela diversidade, na
aceitação das diferenças, no respeito pelas opções religiosas, que nunca foi
utilizada para excluir nenhuma pessoa dos projetos que desenvolvia. Prova disso
é grande número de pessoas evangélicas contempladas com uma moradia no Conjunto
Padre Pedro. Isso mostra que os critérios por ele adotados para ajudar às
pessoas nem de longe se pautavam pela fé que as pessoas professavam, mas
estavam relacionados com o seu compromisso com Deus e com os homens, sem
distinção.
O
evangelho do Senhor Jesus não consiste somente no alimento da alma. Esse
aspecto é relevante, mas Jesus nos ensinou a dar pão aos que têm fome, a
socorrer os que estão necessitados, a visitar os que estão presos, a ser
tolerante com os que erram e a valorizar a vida humana acima de qualquer
tradição.
Sabemos
que a história humana não é um fenômeno natural. Ela é marcada por
acontecimentos desencadeados pela intervenção ou pela não intervenção dos
homens. Quando alguns não agem outros interferem e escrevem a história que
pretendem e que lhes favorece. Padre Pedro nos ensinou a importância da luta e
da participação popular para mudar o rumo da história das nossas próprias vidas
e a história da nossa comunidade. Ensinou a necessidade de intervenção para que
o rumo da história esteja a favor de todos e não de uma pequena minoria. Que
sejamos sábios o suficiente para ler e reler a história desse homem que
escolheu Campo Grande para viver. Uma história que já consta em alguns livros,
mas cuja essência está registrada no cotidiano dos seus dias em nosso meio.
Hoje,
fecha-se mais um capítulo de uma história que não se encerrará. Tenho certeza
de que guardaremos todos os capítulos deste livro vivo que teve para Campo
Grande e para esta região, o valor dos contos infantis, da literatura juvenil,
da filosofia de vida, do melhor da sociologia, da formação política e da fé
testemunhada pelas obras.
Somos
uma geração privilegiada por termos aprendido diretamente com esse mestre,
dentre tantas lições, a do compromisso e da luta por uma sociedade menos
injusta e menos desigual. Penso que a grandeza dos seus ensinamentos deve
integrar os currículos de nossas escolas para que as novas gerações também
tenham a oportunidade de aprender com ele.
Certamente,
ela não deixa bens materiais pessoais para ser dividido. Mas se somarmos o
patrimônio material, intelectual e ideológico que ele ajudou a construir para a
coletividade, contabilizaremos uma verdadeira fortuna. Padre Pedro deixa a
maior riqueza que o homem pode construir. Deixa ideias e sonhos. Não é difícil
construir um patrimônio material, mas ele acaba em pouco tempo. Como disse
Cristo, ele é corroído pela traça e pela ferrugem. Construir ideias e sonhos,
porém, é privilégio daqueles que pensam grande e que conseguem fazer a
diferença num mundo marcado pelo consumismo e pelos interesses materiais e esse
patrimônio é imortal.
Aprendemos
com Padre Pedro a ter esperança de ver essa terra bem mais próspera, com
melhores condições de vida para todos. Aprendemos a sonhar e desejar que os
filhos de nossa terra não precisem se ausentar daqui para poder sobreviver.
Vemos nele a mesma lição ensinada pelo educador Paulo Freire, quando disse:
“Não é, porém, a esperança um cruzar de braços e esperar. Movo-me na esperança
enquanto luto e, se luto, com esperança espero”.
Sua
trajetória nos faz lembrar o que expressou o apóstolo Paulo em sua segunda
carta escrita a Timóteo 4:7, e creio que ele também se expressaria com as
mesmas palavras, no seu momento final: “Combati o bom combate, encerrei a
carreira, guardei a fé”.
Professora
Leida Almeida